Thursday, July 29, 2010

OPINIÃO PÚBLICA E CONTROLE SOCIAL

ARCHBISHOP MSGR.LEONARDO LEGASPI

Aproximamo-nos do término de nossas considerações sobre os fundamentos das Relações Públicas, defrontando-nos com um paradoxo. Alegamos ser Relações Públicas uma expressão que se refere aos aspectos de nosso comportamento individual e institucional que tem amplas repercussões sociais. Dissemos que o problema fundamental de Relações Públicas é colocar esses aspectos em conformidade com o interesse público. E afirmamos que é a opinião pública que, na última instância, melhor define o que é o interesse público.

Notamos também que a opinião pública não constitui um padrão estático e inflexível. Ela própria é o produto final de inúmeras influências que a dirigem e modelam. Especialmente numa democracia, a opinião pública está sujeita a uma mente numa democracia, a opinião pública está sujeita a uma batalha incessante de propagandas concorrentes. Como indivíduos e organizações, tanto a modelamos quanto a seguimos. Usamo-la como padrão de comportamento institucional, e simultaneamente tentamos ajustá-las a nossos desejos.

Nessas circunstâncias, temos diante de nós duas responsabilidades essenciais. Temos o dever de descobrir os meios para ajustar os aspectos de nossa conduta individual e institucional que tem amplas implicações à concepção que a opinião pública tem do interesse público. Para consegui-lo, temos de permanecer alertas, estudando e analisando nossas relações com o público e ajustando-as às tendências da opinião pública.

Esse processo de ajustamento pode ser encarado de duas maneiras distintas. A insatisfação pública quanto à nossa conduta pode apoiar-se validamente nos fatos. Pode exigir uma modificação substancial de nossas práticas individuais e institucionais. É próprio de homens de curta visão imaginar que os desentendimentos são sempre as causas da hostilidade pública. Tensões intergrupais podem originar-se, como freqüentemente acontece, de uma apreciação real, ou talvez, mesmo, de uma compreensão completa dos fatos. A causa de nossas dificuldades pode ser uma compreensão demasiada e não uma incompreensão. As causas da desconfiança pública podem não ser imaginárias nem fantasiosas.

Em recente reunião do Fórum de Relações Púbicas da McGraw-Hill, perguntou-se por que razão as greves mais desastrosas ocorrem em usinas que supostamente temos melhores programas de Relações Públicas. A resposta, presumindo-se que esses "melhores programas" são basicamente de caráter informativo, é que a administração utilizou a premissa falsa de que as causas de intranqüilidade são imaginárias, e não reais. Um estudo cuidadoso do comportamento e das práticas institucionais, em termos de seus efeitos reais sobre os empregados, pode indicar que a fonte de dificuldade não era a falta de informação ou compreensão por parte dos empregados, mas sim a conseqüência natural das próprias práticas institucionais.

Com grande freqüência, entretanto, o processo de ajustamento requer uma ação de tipo completamente diferente. O desajustamento pode provir da falta de compreensão exata das verdadeiras implicações do comportamento institucional. É nesses casos que são valiosos os programas informativos, como os da General Motors, da Companhia Telefônica e Telegráfica Norte Americana, da Indústria Siderúrgica Norte Americana e de muitas outras empresas. Esses programas, quando honesta e inteligentemente executados, fornecem aos empregados e ao público uma imagem mais clara das atividades e dos motivos institucionais do que teriam sem eles.

Nunca será demais salientar a necessidade de proceder, em cada caso, à análise da situação total, a fim de diferenciar as causas reais das imaginárias.

Nossas responsabilidades, entretanto, não terminam quando nossas relações com o público são harmonizadas como a opinião pública. Temos o dever, como cidadãos e membros de uma comunidade nacional, de auxiliar a fazer da opinião pública aquilo que achamos que ela deve ser. Como disse um escritor: "O problema fundamental da opinião pública não é descobrir o que ela é, mas fazer com que ela seja o que deve ser".

A teoria democrática tem afirmações específicas a fazer sobre o papel da liderança de opinião em uma democracia. Da mesma forma como os autoritários, os liberais também reconhecem a importância e o poder da opinião pública – o fato de todos os governos, todas as instituições, todas as leis, o costume, a moral, os padrões do que é certo ou errado receberem sua autoridade da opinião pública.

Além disso, liberais e partidários do autoritarismo percebem igualmente que a opinião pública não tem origem espontânea, sendo apenas um elo na cadeia interminável de causas e efeitos sociais. A verdadeira diferença entre o ponto de vista democrático e o autoritário é que, de acordo com o primeiro, a melhor maneira de aprimorar a qualidade da opinião púbica é estabelecer uma situação em que haja o máximo de oportunidade para que sejam apresentados os diferentes pontos de vista, e, de acordo com o segundo, a melhor maneira de conseguir o esclarecimento popular consiste em dar a responsabilidade da liderança um pequeno grupo de homens considerados sábios.

A propaganda – disseminação consciente de idéias e doutrinas – desempenha, pois, um papel definido, porém distinto, em ambas as teorias. Os liberais acreditam que o aprimoramento da qualidade da opinião pública ocorre muito mais facilmente quando as massas se defrontam com uma multiplicidade de propagandas concorrentes do que quando estão sujeitas a uma única. Os princípios democráticos, como todos os princípios, só se aplicam, porém, em certas circunstâncias. Quais são elas?

Chegamos a uma nova etapa da vida da democracia, caracterizada por uma luta mais ardilosa, mais intensa e mais ominosa para conseguir o controle da mente dos homens. Dirigentes empresariais e lideres de grupo, tanto quanto os governos, estão cônscios da importância da opinião pública. As grandes estão revendo suas políticas de Relações Públicas, estudando seus públicos e aperfeiçoando seus métodos de lidar com eles. Associações comerciais e profissionais, sindicatos e grupos de pressão em geral estão utilizando as práticas existentes e imaginando métodos mais refinados para conseguir o apoio público. Instituições governamentais oficiais acentuam a importância não só de refletir, mas também de liderar a opinião pública.

O que é que nos acontece, entretanto, quando grande número de grupos, de repente, começa a perceber a importância da opinião pública e se lança sofregamente à concorrência propagandística dirigida pelos especialistas? Começa uma corrida, que em nada difere da corrida armamentista internacional; uma luta pela superioridade de instrumentos de propaganda agressiva, que pode ser tão desastrosa quanto a luta pela supremacia nos campos de batalha. O Grupo A moderniza seu trabalho de "Relações Públicas". O Grupo B segue-o. O Grupo A aumenta suas despesas em anúncios e publicidade. O Grupo B faz o mesmo. O Grupo A fabrica notícias, encena demonstrações, produz filmes cinematográficos e compra o tempo de estações de rádio e televisão. O Grupo B examina tudo isso com atenção e prepara a resposta. A propaganda gera a propaganda. A competição pelo controle da opinião pública torna-se intensa. Cada vez maiores quantias são destinadas a esses fins. E o que resulta daí? Qual deve ser, necessariamente, a sua conseqüência última, em termos de bem-estar nacional?

A meu ver, a correta função do propagandística é auxiliar-nos a chegar a conclusões racionais sobre os assuntos importantes de nossas diretrizes governamentais. Os propagandistas têm uma obrigação para com seus clientes, é verdade, mas devem também realizar um serviço público, pois estão relacionados com o interesse público. Em nosso sistema democrático, eles são responsáveis pela liderança de opinião.

Sua responsabilidade social é tão definida quanto a de um advogado, e hoje parece ser ainda mais vital. Nessa corrida de propagandas, os líderes de grupo muitas vezes não se apercebem do fato de que, do ponto de vista social, o importante não é o sucesso do seu empreendimento, mas sim a sua contribuição para o esclarecimento do povo norte-americano como um todo. O verdadeiro sucesso de uma campanha publicitária não pode ser medido em centímetros de coluna de publicidade jornalística, em quantidades de cartas e telegramas recebidos, ou em aumento de vendas. O sucesso social da propaganda deve ter como medida o esclarecimento popular por ela proporcionando. A tese democrática simplesmente não pode funcionar, a não ser que a concorrência propagandística corresponda às suas responsabilidades sociais e procurem esclarecer, em vez de confundir os seus concidadãos.

Os grupos de pressão identificam seus interesses com o interesse público. Essa identificação não se pode efetivar com um simples movimento de pena ou um agitar de mão. O público está sempre interessado em decisões mais sábias e racionais quanto a assuntos de relevância para ele. Sua competência para decidir sabiamente depende, em grande parte, do grau em que os grupos de pressão esclarecem o seu espírito, e não da extensão em que despertam instintos animais. Numa ditadura, em que a responsabilidade pela liderança da opinião é centralizada e monopolizada por uma suposta elite, talvez o efeito social dos apelos irracionais não seja tão desastroso. Em uma democracia, porém, na qual a liderança de opinião é descentralizada e o próprio indivíduo é levado a escolher, temos de estabelecer e manter os melhores padrões de concorrência propagandísitica e assumir a responsabilidade pelo que fazemos. Essa é a primeira condição para que a tese democrática possa funcionar com sucesso.

Outra condição é a liberdade, a verdadeira liberdade de propagar idéias e doutrinas independentemente de sua aceitação por nós. A liberdade perfeita nunca existia, e talvez nunca venha a existir. O problema consiste em reduzir, tanto quanto possível, os obstáculos artificiais que impedem essa liberdade. A democracia é sempre um ideal em processo de realização, nunca um fato completo em si. A liberdade de expressar suas opiniões está sempre condicionada pela liberdade alheia. Não podemos usar todos, simultaneamente, uma mesma estação de rádio, ocupar o mesmo púlpito, ou utilizar o mesmo espaço de jornal. Esses obstáculos podem ser chamados naturais.

Há também muitas barreiras artificiais que dificultam a livre expressão da opinião. A liberdade de expressão está limitada não apenas pela censura formal, mas, também, com relação a muitos, pela impossibilidade financeira de usarem os modernos instrumentos de comunicação, especialmente os de influenciação das massas. A teoria democrática pressupõe que todas as idéias e doutrinas têm substancialmente iguais oportunidades de serem apresentadas. Mas os públicos de massas só podem ser atingidos eficientemente através dos instrumentos de influenciação das massas. O problema está em descobrir o meio de proporcionar iguais oportunidades para o seu uso em nosso sistema social, político e econômico.

A teoria democrática pressupõe também que a área de concorrência da propaganda estará subordinada a condições que facilitarão os processos racionais de pensamento, em vez de obstruí-los. É verdade que as emoções não podem ficar completamente afastadas desses processos. Os propagandistas, entretanto, afastam-se da democracia na extensão em que se apoiam nos apelos emocionais, e não nos racionais. Eis a razão por que o governo interfere, determinando as regras do jogo. Como exemplos, temos as leis contra a difamação e a calúnia, e as que exigem a veracidade da propaganda.

Esses "advogados especiais", entretanto, dispõem agora de tantos instrumentos para despertar as emoções das massas, que a democracia precisa ir mais além na definição das práticas de propaganda desleal. Se, para proteger o júri contra os ardis de certos advogados são indispensáveis aos tribunais regras processuais meticulosas relativas à apresentação de provas e ao interrogatório das testemunhas, quão maior não será a necessidade de regras que regulamentem as atividades desses "advogados especiais" no campo da opinião pública?

O estabelecimento e a aplicação de padrões gerais de práticas permissíveis são uma ocorrência normal em nosso sistema democrático. Isso não é censura, pois não se aplica arbitrariamente em detrimento de certas pessoas ou idéias. Uma certa apreciação do problema já pode ser observada, quando as emissoras nacionais, por ocasião da campanha presidencial de 1936, adotaram a política geral de reduzir ao mínimo os efeitos nocivos dos apelos emocionais. A liberdade de discussão, como princípio do liberalismo democrático, não implica a ausência de regras para melhorar a qualidade da discussão.

A competência da opinião pública para funcionar satisfatoriamente numa democracia depende não apenas da apresentação adequada das alternativas e da ausência de estímulos emocionais, mas também do tipo e da quantidade de informações à disposição das massas. A quantidade de informações que podem ser obtidas hoje em dia é muito grande. As bibliotecas estão cheias delas. O material de leitura é abundante. Uma grande parte da população freqüenta as escolas públicas. As ondas sonoras, a tela cinematográfica e a imprensa proporcionam fontes adicionais de informação. Se medir a competência da opinião pública em termos de informação que pode ser obtida, ela parecerá muito maior hoje em dia do que em qualquer época anterior.

Não é, porém, a quantidade de informação que produz o esclarecimento público. Ela deve poder ser compreendida pelas massas e relacionar-se com os problemas específicos em que estão interessadas. Um simples acréscimo quantitativo pode confundir mais do que esclarecer. A informação para ser útil, deve ser organizada e apresentada de modo a poder ser assimilada. Alguns de nossos jornais são gigantescos reservatórios de informações. Com demasiada freqüência, entretanto, o leitor do New York Times ou do Herald Tribune põe seu jornal de lado com um sentimento de irremediável confusão intelectual. Nossos sistemas educacionais procuram trazer um pouco de ordem ao caso em que se encontram os estudantes, mas nenhuma metodização curricular ou departamental existe nessa avalancha de fatos com que se defrontam os adultos.

A suposição de que a qualidade das opiniões melhora, à proporção que aumentam as oportunidades para a consideração de pontos de vista alternativos, requer maior exame. A capacidade de pesar satisfatoriamente os méritos relativos das opiniões em conflito pressupõe condições que freqüentemente não existem. Como foi anteriormente assinalado, há poucas regras, se as houver, para o exercício dessa "advocacia especial" no campo da opinião pública. Não se determina a ocasião das audiências. Não há ordem no processo, nem regras para apresentação de provas, nem prazos a cumprir. Os assuntos permanecem indefinidos. Os advogados falam tantas vezes e tanto tempo quanto querem. Antes de ser decidido um assunto, outros são incorporados ao processo. Não há nenhuma tentativa de acareação. Quase toda a argumentação é de iniciativa das partes. Um dos problemas mais angustiantes do nosso tempo é por ordem nessa discussão. A liberdade de opinião não é um fim em si; é um meio para chegar a um fim - o esclarecimento da opinião pública. Ela só pode atingir o seu objetivo na medida em que sejam evitados os abusos e colocada ordem nesse caos.

As emoções e os sentimentos são geralmente considerados estorvos para o pensamento lógico. Desempenha, porém, na realidade, importante papel, tanto na vida do Estado quanto na do indivíduo. Mas que papel? São poderosos instrumentos de ação, extremamente úteis na transformação das opiniões em desejos. Confundem-se, freqüentemente, as funções respectivas da vontade e da emoção. No mundo caótico das propagandas em conflito, há quem procure, deliberadamente, agravar essa confusão. A predisposição para pensar com seus sentimentos é, com freqüência, estimulada e reforçada pelo uso de símbolos - palavras ditas em tom emocional, imagens e apelos dramáticos - em detrimento da razão.

Para estudar o papel que cabe à opinião pública em uma democracia, devemos aceitar os fatos, considerando a opinião pública como ela é. Não se pode pressupor a existência de condições que não existem, nem considerar que as massas estão informadas, quando elas não estão; que tem possibilidade de pesar com inteligência os diferentes pontos de vista, quando elas não têm; que as emoções estão controladas, restringindo-se ao seu papel apropriado, quando isso não ocorre. Apesar da enorme quantidade das informações existentes, o cidadão comum nem sempre as recebe. Talvez não tenha acesso a ela. Talvez não tenha tempo para estudá-la ou capacidade para entendê-la.

Ninguém dedicou maior atenção a esses assuntos do que Walter Lippmann. A seu ver, o papel que as teorias democráticas atribuíam, a princípio, à opinião pública era demasiado idealístico; mesmo nas melhores circunstâncias o público é incapaz de julgar o mérito de um assunto. O máximo que consegue fazer, dizer ele, é decidir a qual dos grupos em conflito diretamente relacionados com o problema ele dará o seu apoio. Cabe aos cientistas sociais fornecer-lhe alguns critérios simples e objetivos que lhe permitam chegar a uma decisão.

A análise de Lippmann apresenta muitas dificuldades. Uma delas é encontrar essa lista de critérios facilmente reconhecíveis. Outra, aplicar esses critérios a situações específicas e conseguir acordo quanto ao modo de fazê-lo. Há também o problema de estabelecer uma linha definida entre quem está dentro e quem está fora do conflito. Em questões relativas a desemprego, guerra, impostos e outras semelhantes, os interessados constituem, praticamente, a totalidade da população. Além disso, há o problema de conseguir que o público abandone o hábito de não considerar os méritos dos assuntos específicos, colocando-se, simplesmente, a favor de um ou de outro lado.

Muitas outras sugestões têm sido formuladas para melhorar a qualidade da opinião das massas. Uma que é oferecida com freqüência e muitas vezes casualmente é a educação. A educação formal, entretanto, atinge apenas uma pequena parte da vida dos cidadãos. Raramente lhes fornece, em técnicas ou em informações, o equipamento necessário para acompanhar as rápidas transformações das situações sociais. A lacuna existente entre a ocasião em que se fazem os esforços para educar os jovens e a ocasião em que eles estão aptos a utilizar efetivamente o que aprenderam é considerável. As técnicas e informações aprendidas já estão, freqüentemente, ultrapassadas no próprio dia da colação de grau. A opinião atual das massas, como decorrência da educação formal, é em grande parte, o produto do que se ensinava há quinze ou vinte anos.

O ensino público formal pode dar aos estudantes um conhecimento do desenvolvimento histórico do mundo em que vivem, uma base de informações sempre úteis na solução dos problemas quotidianos. Pode dar-lhes, também, uma atitude mental, um método para encarar os problemas, o que sempre tem valor. O treinamento sobre o uso e o abuso da lógica auxiliá-los-á a evitar as piores armadilhas da irracionalidade. Submeter-se a diferentes pontos de vista serve para adquirir um espírito de tolerância e paciência. A educação formal, entretanto, não pode dar as respostas a muitos problemas sociais específicos com que se defrontarão os alunos vinte anos depois.

A democracia está entrando em uma era em que a idéia de reunião de todos os cidadãos está sendo trazida do âmbito municipal para o nacional. A conclusão de Platão de que a democracia – no sentido de governo direto da opinião pública – é impraticável, exceto em comunidades de cinco ou seis mil pessoas, não considerou o futuro impacto do desenvolvimento técnico das comunicações sobre o âmbito e a natureza dos contatos humanos. O rádio possibilita agora dirigirmo-nos, simultaneamente, a quarenta ou cinqüenta milhões de pessoas, tão eficaz e convenientemente quanto os oradores de outrora apresentavam seus pontos de vista a aglomerações de alguns milhares. As dimensões da democracia estenderam-se muito além do alcance normal da voz humana.

Ao mesmo tempo em que o desenvolvimento técnico aumenta a extensão do que se ouve e do que se vê, possibilita também às massas comunicar suas respostas aos governantes quase com a mesma rapidez com que os governantes comunicam suas idéias a elas. Os dirigentes governamentais já podem apresentar suas perguntas às massas em um dia e obter as respostas no dia seguinte. O povo pode hoje ouvir as discussões sobre assuntos públicos, em um dia, e julgá-las no dia seguinte, tal como fazia nas reuniões das cidades de outrora.

Um momento de reflexão, entretanto revela que a nação, em seu conjunto, está mal preparada para uma ação coletiva desse tipo. Não há nenhuma das salvaguardas que facilitam as discussões e as deliberações coletivas das reuniões de cidadãos. Na se marca a hora das reuniões, não se estabelece, sistematicamente, a ordem dos trabalhos, nem as regras dos debates, nem se formulam cuidadosamente as perguntas. Como se podem melhorar a natureza e os métodos de discussão pública?

Em primeiro lugar, há necessidade de um centro de recepção de idéias e opiniões, um reservatório onde os indivíduos e grupos com idéias brilhantes e novas possam depositar as suas questões. Uma das principais funções desse centro deve ser ordenar e classificar essas idéias, eliminar as duplicações, reformular e integrar outras, a fim de que possam ser apresentadas ao público de modo sistemático. A classificação ordenada permitiria uma indicação mais significativa dos problemas. O cidadão comum geralmente não consegue examinar todas as idéias e programas, e separar as de menor e as de maior importância. É preciso haver uma instituição que faça isso por ele.

Até certo ponto, os nossos órgãos legislativos servem para esse fim. Qualquer um tem o direito de trazer-lhes, como petição ou em alguma outra forma, quaisquer idéias ou planos que tenha. Partidos políticos também se desincumbem, até certo ponto, dessa função. Infelizmente, entretanto eles só o fazem periodicamente, e considerações eleitorais forçam-nos, freqüentemente, a desviar-nos dos assuntos realmente importantes. Por melhor que funcione nosso mecanismo eleitoral como instrumento selecionador de candidatos a cargos públicos, ele fracassa totalmente como mecanismo para definir e apresentar os assuntos públicos.

Se tiver de pedir ao público que expresse suas opiniões sobre assuntos de interesse nacional é indispensável melhor o método de seleção, formulação e apresentação das questões. Elas têm de ser importantes. Devem ser tais que se possa esperar que o cidadão comum tenha uma opinião a respeito delas. E devem ser formuladas de modo que as respostas possam significar alguma coisa. Há uma série de entidades privadas que se dedicam a pesquisar a opinião pública, mas o mecanismo dispendioso empregado na amostragem da opinião é, com demasiada freqüência, utilizado para finalidades triviais, ou em forma tal que os resultados obtidos tem pouco ou nenhum significado prático. Esse mecanismo poderia ser levado a servi ao interesse público de maneira mais adequada do que agora. Poderia tornar-se parte integrante e socialmente útil no sistema democrático, em seu conjunto.

Do ponto de vista do cidadão individual, que é sujeito e objeto da propaganda, uma questão vital é a seguinte: que propaganda aceitar e seguir? Pode-se selecionar, entre as muitas propagandas concorrentes, as que são socialmente desejáveis? Há critérios que indiquem as causas que são boas e as que são más?

Muitos são inclinados a fugir à presente necessidade social de uma resposta. Como cientista sociais, presumivelmente desprendidos, objetivos e científicos, descendo os olhos para um mundo de homens e mulheres em luta, preferimos analisar o comportamento social como o psicólogo e o fisiólogo que examinam a história da vida ou o comportamento íntimo de ratos e camundongos. Impermeáveis às conseqüências sociais, recusando ser incomodados com questões de valores, sem mesmo nos preocuparmos com nosso próprio destino, contentamo-nos com descrever, analisar, classificar e experimentar.

É indispensável a função do cientista social, daquele que, socialmente imunizado, segue em busca da verdade. O mundo deve muito aos que devotam suas vidas à busca de novos fatos e princípios. Mas não lhes deve tudo. São também dignos de louvor os líderes de opinião, cujas filosofias e ideologias tem desempenhado importante papel na evolução social. A busca dos fatos e princípios deve continuar, mas, enquanto isso, a atuação das grandes massas de homens e mulheres continuará a ser guiada por suas crenças - crenças em ideais e valores, cuja verdade não pode, em última análise, ser reduzida a irrecusáveis demonstrações de validade.

Sem dúvida, o melhor antídoto da propaganda é o fato, o fato comprovado pelos melhores argumentos científicos disponíveis. À maior parte dos problemas cruciais da sociedade moderna, entretanto, não se pode responder em termos inequívocos e com base nos fatos. A verdade absoluta, verificável através da experimentação científica, compreende apenas uma pequena parte do campo em que devemos agir. Mesmo que fosse possível abolir todas as formas de propaganda, pela simples razão de não poderem os ideais e propósitos advogados sujeitarem-se à fria análise do tubo de ensaio de uma experiência científica, ainda assim seria questionável a sua conveniência. Até que toda a verdade seja revelada, haverá sempre lugar a fé, fé em algum ideal, em algum Estado futuro, que parece ser, embora não seja possível demonstrá-lo, superior ao que temos agora. Assim sendo, o problema fundamental de qualquer ataque sincero à propaganda é, mais cedo ou mais tarde, o de responder à questão: que propaganda?

Um momento de reflexão indica não haver padrões rigorosos e imediatos segundo os quais possam ser diferenciadas as causas boas e más. Essa conclusão deixa o cidadão, é mais especialmente o professor de ciências sociais, em uma situação confusa. Pode-se, pois, concluir daí que, não havendo padrões infalíveis para a verdade, toda e qualquer propaganda é, por conseguinte, indiferentemente válida? Ou quer isso dizer, talvez, que devemos renunciar à função de liderança de opinião e retirar-nos ao santuário dos fatos e princípios demonstráveis?

Como a questão da vida e da morte, a opção, em última análise, será individual. Podemos retirar-nos círculo interno onde só se encontram os fatos e princípios cuja veracidade é indiscutível; e podemos escolher, entre as variadas propagandas, quais as que devem ser seguidas. Teoricamente, a resposta parece encontrar muitas barreiras filosóficas. O senso comum e uma visão mais prática e realística da situação sugerem, porém, um procedimento aceitável.

Sem exigirmos que qualquer causa, para conseguir nosso apoio, seja considerada válida sem qualquer sombra de dúvida, podemos formular certas perguntas para base de nossa orientação. Quem está advogando o programa, a causa ou a plataforma? Quem está de fato, e não apenas na aparência, por trás de tudo isso? Estão esses verdadeiros líderes de opinião motivados por interesse sociais ou por interesses individuais? Seu conhecimento do assunto sobre o qual estão falando é de primeira ou de Segunda mão? Os objetivos e os meios propostos para atingi-los tem aceitação gera, ou são sujeitos a críticas consideráveis? Quem se opõe a essa causa específica? Em nossa estimativa, representam os opositores um grupo mais inteligente e com maior motivação social do que aqueles que advogam o programa?

Essas questões e outras semelhantes se devidamente consideradas, retirarão, de saída, o nosso apoio de muitas causas. Deixar-nos-ão, entretanto, inúmeras outras, cuja utilidade social pode ser assunto de debate. Embora nunca possamos estar certos de ter escolhido o único ou o melhor caminho, uma resposta cuidadosa a essas questões resolverá pelo menos, as principais dificuldades e evitará os erros mais sérios.

A tese democrática considera que, se assegura livre e restrita competição às propagandas, a melhor, num sentido pragmático do termo, prevalecerá. Sem tentar formular uma coisa que impeça ou prejudique a liberdade de todas as propagandas tende a tornar a tese irrealizável. Além disso, as influências que servem para levantar a competição do nível emocional para o racional contribuem para o seu benefício. Em última instância, depois de obtidos todos os fatos e depois de aplicados todos os princípios pertinentes, o homem tem de apoiar-se na razão, no que de melhor possa ser encontrado no domínio da inteligência e da prudência. Os perigos sociais de escolhas insensatas serão reduzidos, em grande parte, pela atuação de forças que dêem à razão oportunidade de prevalecer sobre a emoção. Não se pode suprimir a propaganda. Talvez se possa, porém, levantar o nível e os padrões da competição e, pelo menos, melhorar as probabilidades que a razão tem de sobreviver. Devemos, pois, procurar evitar propaganda que negligencia a razão e apela apenas para a emoção.

O propagandista é freqüentemente considerado digno de crítica em virtude das causas que promove. Recebe, com igual freqüência, o rótulo de mau em vista dos métodos empregados para conseguir o apoio público. Os estudiosos da propaganda não tem poupado esforços na busca de provas de informações deliberadamente deturpadas, de sonegação de fatos, de adulterações, bem como de outras provas de mentiras dirigidas ao público. Não há dúvida que existem práticas desse tipo. A mentira pública, porém, da mesma forma como a mentira privada, não é característica particular dos tempos modernos. Não é um método necessário e, freqüentemente, também não é o que costuma ser empregado. Se eliminarmos de nossas considerações o que podemos chamar mentira inconsciente, isto é, a sincera promoção de ideais e causas que, posteriormente verificamos não o merecerem, descobriremos, provavelmente, que a quantidade total de falsificação deliberada é menor do que supomos.

Na avaliação dos métodos da propaganda devem-se considerar não apenas os meios, mas também os fins. Da mesma foram como, em nossa seleção das causas a apoiar, precisamos comparar valores relativos, assim também, ao formularmos um julgamento sobre os meios empregados pelos propagandistas, a validade do objetivo visado deve ser pesada juntamente com a utilidade social da não utilização de certos meios. Aqui, de novo, o senso comum e a razão devem ser nosso guia, pelo menos na maioria dos casos. Certamente, se decidirmos que os meios empregados na promoção dos objetivos da Cruz Vermelha Norte-Americana são aceitáveis, não teremos razão de condenar os mesmos meios, como meios, quando usados para promover uma causa que consideramos socialmente reprovável. Com demasiada freqüência, porém, condenamos os meios utilizados para promover uma causa, simplesmente por não acreditarmos nessa causa. Considerando a utilidade social de um regime de tolerância, de concorrência propagandística; e considerando, ainda mais, a vantagem de um nível de discussão racional tão alto quanto possível, o problema dos métodos de propaganda utilizados passa a ser o do incentivo às técnicas que apelam para a razão e da supressão daquelas que são irracionais.

Que é necessário para uma compreensão inteligente da propaganda? Em primeiro lugar, é preciso tomar consciência da sua extensão e caráter; da variedade de filosofias, causas e ideologias que tem tido importância através da história do mundo. Em segundo lugar, é necessário compreender os métodos empregados, os vários tipos de raciocínio, de argumentação e de persuasão cuja eficácia foi comprovada em promoções. Mas é ainda mais importante estar consciente dos problemas filosóficos envolvidos; estar consciente de que o problema fundamental é saber que propaganda seguir. Porque, quando seguimos uma propaganda, devemos fazê-lo conscientemente, se não quisermos ser tangidos como ovelhas. Não basta sublinhar os truques e subterfúgios empregados. Não basta chamar a atenção para o mal, como o concebemos. Sempre que possível, devem-se procurar os fatos. Quando não puderem ser obtidos, deve haver uma busca interminável da melhor opinião, qualquer que seja o campo em que estivermos atuando. Em outras palavras, a busca da verdade deve continuar e, com freqüência a verdade de maior relevância é simplesmente uma opinião inteligente ou uma crença prudente.

Através deste curso de onze palestras, tentei esclarecer a conceituação de "opinião pública" e "propaganda", mostrando as suas correlações com o assunto de Relações Públicas. Outros conferencistas definiram "Relações Públicas" em termos da prática atual dos indivíduos instituições. O que tentei fazer foi reunir a multiplicidade da prática na unidade de um mosaico, a fim de podermos compreender não só o que estamos fazendo, mas também a razão por que o estamos fazendo. Convém agora, creio eu, resumir os vários pontos que forma aqui formulados e explicados.

  1. Relações públicas, em seu sentido mais amplo, referem-se àqueles aspectos do nosso comportamento individual ou institucional que tem implicações sociais.

  2. O problema fundamental de Relações Públicas é por essas relações em conformidade com o interesse público - um interesse que está sendo constantemente redefinido pela opinião das massas.

  3. Temos não só o dever de sujeitar-nos à opinião pública, mas também a responsabilidade e a oportunidade de modelá-la e guiá-la.

  4. Agindo assim, precisamos estar conscientes do significado social da propaganda - do papel que lhe cabe na teoria democrática e das condições essenciais para o seu correto funcionamento.

  5. Em última análise, a opinião pública é aquilo que, coletivamente, fazemos com que ela seja. Só quando procuramos, de todas as maneiras possíveis, melhorar a sua qualidade, é que nos libertamos dos perigos do conformismo.

No comments:

Post a Comment